Série "Crônicas de Guerra"
Trincheira
Terminávamos de cavar um buraco e colocávamos
sacos de areia para ser uma trincheira. Havia uma corda enrolada no chão. Eu
pisei nela e me enrolei, caindo dentro do buraco da trincheira. Fiquei com
parte do corpo enrolado na corda, o que me deixou de certa forma amarrado. Caí
de lado, em meio à lama do local e com os braços para trás.
Como
fiquei amarrado, caído de lado, no meio do buraco cheio de lama, acabei
lembrando-me de quando fui torturado e jogado dentro da cova.
Minha mente ficou como que saturada daquele momento tão horrível que passei,
dos quatro dias dentro de uma cova, amarrado, sem comer, sem beber, tentando
sobreviver. Eu não sei como fiquei, mas não consegui mais me mexer apesar de
não estar preso realmente e o buraco da trincheira nem ser tão profundo quanto
à cova.
A
lembrança foi tão forte, que acredito que passei a revivê-la. Ouvia os chamados
de meus colegas e não conseguia voltar onde realmente estava.
Ouvi
a voz de Flores:
–
Coronel, aconteceu algo com o Sargento Irving! Ele está estranho.
Eu
queria retornar e voltar a mim, mas não conseguia. Era mais forte a sensação de
estar novamente naquela cova, amarrado e ferido.
De
repente senti dois tapas fortes dados no meu rosto e vi que já estava fora da
trincheira, desenrolado, sentado no chão. Não vi quem deu os tapas. O coronel
estava diante de mim, o mexicano num dos lados, no outro Becker e atrás, vários
de meus colegas, inclusive Johnson.
O
coronel perguntou;
–
Está melhor, sargento? – e eu sinalizei com a cabeça que sim. Mas estava
desorientado.
– O
que estávamos mesmo fazendo? – perguntei confuso.
– O
que aconteceu, sargento? – perguntou Flores. – Por que você estava daquele
jeito estranho, irlandês?
Eu
não respondi e recordei novamente da cova. Becker ousou dizer:
–
Você se lembrou de quando foi torturado, amarrado e jogado na cova, não foi,
sargento? – sacudi a cabeça, afirmando, triste. – Eu sabia. Vi pela posição que
ficou: a mesma que tinha ficado quando foi jogado na cova – Becker reconhecera
por ter me visto na cova, quando tinha sido torturado e preparavam para me
enterrar vivo.
Becker
tocou no meu ombro e sussurrou:
– Não
lembre mais daquilo, foi um momento muito ruim, mas já acabou.
Eu
não disse nada. Mas era uma coisa difícil de esquecer.