sexta-feira, 11 de março de 2016

Alucinação Mortal - Conto





          Silencioso desde o momento que o vi... talvez a imagem fosse a de um espelho. Não, o silêncio dava gritos em meus ouvidos. Resolvi não dizer nenhuma palavra... bem capaz que eu fosse pedir para me falar alguma coisa. O vento caprichou por entre a estrada de areão. Eu poderia cuspir um tijolo: Que poeira! O jipe pulava por entre os buracos do meio do caminho. Uquii! Ouvi um grunhido dele. Estava tão fascinada que nem notei por que havia grunhido. Não tirava os olhos dele e ele da estrada mudando sua face simpática para uma de pavor. Um grito substancial quebrou o espelho... ou o silêncio:
          - Oh, meu Deus!
          Meu corpo enfiava-se em meio aos espinheiros da beira da estrada. O carro rangia estridente. Outro tipo de lata sangrava e amassava meu corpo. O sangue escorria por tudo. Gritei como meu amado:
          - Oh, meu Deus!
          Meus olhos o procuravam, mas mal podia eu enxergar. Estava longe do veículo e meus sentidos desligando-se automaticamente apesar de não sentir dor, estava a procura dele... dele... dele.
           Alguém andava no meio daquele matagal. Pareciam passos de animais quadrúpedes. Vi um cavalo e um homem. Ou era um homem cavalo? Espera aí? Isso não existe! Ele olhou para mim e sussurrou em uma linguagem desconhecida, algo. Veio mais perto e se abaixou. Pegou-me nos braços e carregou-me cuidadosamente. Senti minha carne gemer... via seu rosto... não podia acreditar... Era o meu amor, o dono do jipe. Ele me colocou em uma cama e outro ser estranho - parecia um fauno, mas com o rosto do meu amor - cuidou-me com diversos remédios. Senti distanciar-se e um anjo desceu para perto de mim, também com o rosto dele.
          Senti que estava delirando... ou morrendo. Alucinada por uma paixão que nunca ousou principiar. Deixei uma lágrima cair e vi um jato d'água correr no meu rosto. Uma cachoeira me encharcava. Vi minha vida correr como a última gota de um copo d'água... Eu estava morrendo. Mesmo com os olhos fechados via a figura dele em um caixão. O sangue corria por sua boca como esta cachoeira da vida. Um grunhido e a morte num lugar onde ninguém ousaria passar. O fim do mundo e de meu mundo.
          - Por favor, acorde! - disse uma voz apavorada.
          Abri meus olhos. Era ele novamente, mas desta vez normal. O lugar era todo branco, eu estava deitada e havia homens de branco. Sussurrei:
          - Nós morremos? Estamos no céu?
          - Não...
          - No inferno?
          - Claro que não! Nós estamos muito bem vivinhos. Fomos salvos por uns fazendeiros que passavam pela região. Eles vieram a cavalo e nos levaram a um celeiro perto daqui, onde eles criavam cabras e galinhas. Chamaram uma ambulância e nos levaram para este hospital.
          Eu sorri e tive a chance de abraçar meu amor mais uma vez... Porém ele foi atingido por uma flecha de um centauro e morreu em meus braços. O homem pássaro comeu os miolos de todos os médicos e o fauno dançou ao redor dando risadinhas medonhas. Eu morri naquele momento.
 
Texto de Cláudia Elisabeth Ramos
 Premiado com o 1º Lugar em Conto no
 "VII Concurso Literário Viamonense" (1991)
 Edição Festiva de 250 anos de Viamão.
 
 
 


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