O voo de Teresa
Teresa olhava a cidade do alto. As pessoas, como formigas, iam e vinham, a pé ou motorizadas. Vazia, nada tinha sentido a Teresa. O tudo virara nada na confusão íntima de suas memórias.
Trajeto infame fora descrito pelo destino de Teresa. Em uma família de muitos filhos, de muitos pais, só restava-lhe a mãe, de que nada adiantou, soltando-a no mundo à procura de míseros trocados. A fome era apenas um pouco do sofrimento, comparado ao fato de viver ente a violência da periferia social. Roubos, assassinatos, estupros, preenchiam seus dias como se nada fossem.
A prostituição veio-lhe como saída. O dinheiro para saciar a fome vinha fácil e era mais simples que roubar, não desafiaria tanto a polícia em seu cotidiano. Porém aquilo a degradava cade vez mais, ninguém mais a olhava com boas intensões, e seu corpo passava a manifestar vários tipos de doenças, da maioria das vezes venéreas. Gravidez indesejada vinham volta e meia e muitos os fetos abortados da forma mais violenta existente.
As drogas aliviavam as dores do corpo e da alma. Do álcool e fumo, a maconha e o craque. Sem temer a ninguém , deixava a vida solta feito um papel de lixo correndo em um riacho poluído. A AIDS adquirira de algum dos modos prováveis para a transmissão; afinal, fazia parte do grupo de risco e nenhuma precaução tomava para evitar, até mesmo por ignorância. A princípio invisível, passou dela a muitos. Na inocência e na culpa. Como iria viver se parasse? As dores vinham sagazes e destruíam por dentro. Quando soube, não se importou. Atirou-se mais na vida e tentou evitar o contágio a outros com camisinhas. Mas muitos clientes não queiram usá-la, pelo desconforto. Se cliente exige, o que se pode fazer? A culpa é dele.
E agora, convidada pela formosura restante de sua beleza infanto-juvenil, jovem como era. Fora levada a um apartamento no 13 º andar, de um pobre filho de milionário, também drogado. Olhava da sacada do edifício melancólica. Jogar-se... o desejo de acabar com as dores da alma assolava Teresa. Com a consciência assombrando-a perante crimes que cometera, nada tinha razão de ser. A morte! Queria a morte. Subiu ao parapeito com o coração dilacerado.
Seu reflexo côncavo na vida social, o pobre milionário rico, olhou-a em transe da droga a pouco injetada, compartilhada na mesma seringa por Teresa, num sorriso débil , perguntou:
- Quer voar?
- Quero! - respondeu ela.
Ele chegou bem próximo, puxou-a, acariciando seus lindos seios e lh dando um beijo nos lábio, como num adeus. Depois sorrindo declarou:
- Voe!
E teresa voou para a eternidade. Sua alma coberta de feridas acordou, esperando que os anjos pudessem aliviar sua dor.
- Voe anjo! - disse o rapaz.
(Crônica de Cláudia Elisabeth Ramos)
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